Trata-se de um sensível e profundo
filme que a partir dos discursos de gêneros (O que se espera de um corpo
biologicamente feminino? O que se espera de uma vida nomeada como masculina)
dispara reflexões sobre felicidade, amor, vida em sociedade, amizade, gosto
pelo saber, paradigmas e algumas formas que o sistema disponibiliza para dar
sentido à existência.
No estado de Massachusetts no ano de
1953 a professora Katherine Watson chega para ministrar aulas de História da
Arte na tradicional Wellesley College. Proveniente da ensolarada e progressista
Califórnia, Katherine tem entusiasmo pelo saber, imagina que atuar em uma
escola elitista, destinada apenas para mulheres, é uma forma de potencializar a
emancipação feminina rumo a locais de liderança e transformação do mundo.
Para a aplicada estudante Betty
Warren a professora Watson “tinha em inteligência o que lhe faltava em
pedigree”.
Logo em sua primeira aula as bem
vestidas e cultas alunas a surpreendem respondendo todo conteúdo do plano de
ensino, evidenciando que conhecimento técnico não é um problema por ali.
A surpresa maior está quando
Katherine percebe que o discurso que subjetiva a maioria das mulheres daquela
instituição não é diferente do que está lá fora: fazer um bom casamento e ser
financeiramente dependente de um homem, estando os estudos em segundo plano, um
pano de fundo para uma ‘boa e culta esposa’.
A professora inicia uma jornada rumo
a desconstrução daqueles engessantes paradigmas, que em suas palavras eram ‘uma
nova forma de espartilho’ que pouco avançavam no quesito de colocar as mulheres
em um lugar de emancipação.
O filme também deixa implícito que a
ideia de patriarcado, importante conceito que serviu para demonstrar os privilégios
sociais/culturais/econômicos que os homens contavam e contam em relação às
mulheres, precisa ser revista. Afinal, no campo afetivo que produz a
significação de vida os homens estariam tão oprimidos quanto as mulheres,
quando também são obrigados a performatizar rígidos papéis identitários.
Esta ideia é exemplificada pelo professor
de italiano Bill Dunbar, homem sedutor e inteligente que conta com a aparente
liberdade masculina para dormir com quem quiser e desfrutar de sua solteirice
depois dos 30, inclusive com suas alunas. Porém,
a miséria emocional com que homens são construídos no formato tradicional fica
evidente quando de um bem sucedido herói de combate Dunbar é desmascarado como
mero figurante da segunda guerra, sem nunca ter estado em campo de batalha.
Afinal, porque ele precisava viver essa e outras mentiras como parte de seu ser?
Quais expectativas são também depositadas neste tipo de subjetivação masculina?
É desta percepção vazia que
descobrimos como o discurso tradicional de masculinidade como sinônimo de força,
liberdade, liderança, racionalidade e sexualidade compulsória pode alienar o
homem do contato mais profundo com sua própria subjetividade, roubando a
maioria de suas experimentações como ser humano. Os privilégios dados aos
homens, quando olhados desta perspectiva, também restringem sua existência.
Parece muito massacrante sustentar o
pesado papel de “macho provedor” produzido à partir de uma renuncia de sua
sensibilidade, na imposição de uma hipersexualidade, como se sua frieza e falta
de tato fossem uma justificativa natural da diferença orgânica entre os sexos
que organiza a sociedade, não sem um alto custo emocional para todas as expressões
de gênero.
Dunbar não é menos solitário do que
a personagem Giselle Levy, a “subversiva aluna judia” que tinha em encontros
sexuais corriqueiros e constantes não um possível estilo de vida potente mas
sim uma forma de aliviar o vazio que se constituirá em sua vida, grande parte
porque não encontrava significado nos paradigmas dominantes de amor, realização
sexual e instituição do casamento (um dos tripés ideológicos do ocidente nos últimos
200 anos). Ambos pagavam preços diferentes, porém com fundos emocionais bem
parecidos no vazio. Se tal arranjo de banalização sexual declarada é uma exceção
às mulheres parece ser uma imposição aos homens.
Dentre tantos outros disparadores o
filme ganha muitos pontos ao não oferecer uma visão fechada do que seria amor e
felicidade, a crítica aqui não é para o casamento, mas sim para a forma como o mesmo
é oferecido e imposto como único e universal caminho. A própria Katherine se vê
em um posicionamento inesperado ao reconsiderar sua vida unicamente boêmia
enquanto suas alunas vão no movimento oposto.
O sorriso de Monalisa nos mostra que
o casamento é uma boa possibilidade, porém nem de longe é a única.
Se ao olhar o quadro de Da Vinci não
sabemos ao certo que segredos o sorriso esconde nem muito bem com o que ele se
parece a narrativa vem nos chamar a atenção para um fato: o de que “ser” é
muito mais importante do que “parecer”, nada mais atual para uma cultura que
estimula a imagem e a ilusão do sucesso, produzindo aparente felicidade mas
vazios e tristezas constitutivamente profundos.
Filme que se torna intrigante pela somatória de questões implícitas e explícitas, tendo o paradigma e a subjetividade como questões disponibilizadas para uma bela análise da sociedade, valores, cultura, entre outros tantos, não só presente na década de 50 nos EUA, mas vivos também na atualidade. Conheci o filme na aula de Humanidades,....ótimo, recomendo!!!!
ResponderExcluirÓtima resenha! Gostei muito dos pontos citados e através deles consegui ter uma visão melhor das subjetividades do filme. Muito obrigado.
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